Até o início do século XX, era comum entre trabalhadores das minas de carvão a prática de monitorar a presença de gases tóxicos ou asfixiantes usando canários. A suposição era que os pássaros seriam os primeiros a morrer na presença de asfixiantes como o monóxido de carbono (CO), antes que os mineiros sofressem ameaça às suas vidas.

O monóxido de carbono é um gás à temperatura ambiente, de aparência incolor, sem cheiro e sem sabor. É caracterizado como um asfixiante químico, pois impede a utilização biológica do oxigênio e, por isso, é extremamente tóxico. Por conta de suas características físicas, é um gás de difícil detecção pelos sentidos humanos, o que o torna ainda mais perigoso. Seu LT (1) é de 39ppm e é IPVS (2) a partir de 1200 ppm.

Hoje em dia, podemos considerar a utilização de pássaros como algo cruel, mas as condições da época não forneciam muitas opções para salvar a vida dos mineiros.

Mas será que os mineiros estavam realmente “protegidos” pela presença dos canários? A resposta infelizmente é não.

Assim como a maioria dos pássaros, os canários possuem um sistema respiratório, que trabalha sempre tentando obter o máximo de oxigênio do ar. Essa propriedade é importante porque, além do alto gasto energético durante o voo, em grandes altitudes o ar se torna rarefeito, exigindo uma maior eficiência na absorção do oxigênio.

Vejamos algumas comparações do efeito do CO sobre canários e sobre seres humanos.

Até uma concentração de 1.500 ppm (partes por milhão) de CO, com uma exposição de 20 minutos o canário nada irá sofrer, mas o homem sentira palpitações, dor de cabeça e poderá desfalecer.

Nessa mesma concentração de CO, com uma exposição de 40 minutos o homem poderá morrer, enquanto o canário não irá enfrentar maiores consequências.

O mesmo efeito irá ocorrer para concentrações de CO de 1.000 ppm durante 80 minutos e 500 ppm por 160 minutos, ou seja, o homem perece e o pássaro sobrevive, falhando dessa forma na sua função de alertar contra a presença do monóxido de carbono.

A chegada dos detetores de gás na indústria da mineração de carvão pôs fim a uma tradição de mais de um século da Grã-Bretanha, na qual passarinhos eram utilizados como detetores de gases nas atividades dos trabalhadores das minas.

Hoje em dia, essa antiga prática é totalmente impensável, tanto pela crueldade com os pobres animais, como pela inadequação dos pássaros perante os modernos detetores, tanto no que se refere a acuidade da detecção, quanto nos alertas de abandono através de sinais óticos e acústicos que os detetores possuem.

 

  • De acordo com a NR-15 “Limite de Tolerância”, é a concentração ou intensidade máxima ou mínima, relacionada com a natureza e o tempo de exposição ao agente, que não causará danos à saúde do trabalhador, durante a sua vida laboral.
  • IPVS – imediatamente perigoso à vidaou a saúde.

Um local é considerado IPVS quando ocorres qualquer uma das seguintes

Situações (*):

  1. a) a concentração do contaminante é maior que a concentração IPVS, ou

suspeita-se que esteja acima do limite de exposição IPVS; ou

  1. b) é um espaço confinado com teor de oxigênio menor que o normal (20,9%

em volume), a menos que a causa da redução do teor de oxigênio seja conhecida e controlada; ou

  1. c) o teor de oxigênio é menor que 12,5%, ao nível do mar; ou
  2. d) a pressão atmosférica do local é menor que 450 mmHg (equivalente a 4.240 m de altitude) ou qualquer combinação de redução na porcentagem de oxigênio ou redução na pressão que leve a uma pressão parcial de oxigênio menor que 95 mmHg.

(*)Conforme Programa de Proteção Respiratória – Fundacentro – Antonio Vladimir Vieira e colaboradores.

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